Grandes conquistas podem surgir de pequenos gestos de coragem. Foi assim que nasceu a primeira Barbie negra, em 1980, a partir de uma simples pergunta, como conta o documentário Black Barbie, disponível na Netflix.
O filme traz entrevistas com mulheres que trabalharam na Mattel – fabricante da boneca – e tiveram papeis cruciais nessa construção.
A primeira delas foi Beulah Mae Mitchell, uma mulher negra que trabalhava na fábrica e teve a ousadia de perguntar à Ruth Handler, criadora da Barbie: “Por que não fazemos uma Barbie que se pareça comigo?”.
Embora pareça estranho afirmar que uma pergunta tão básica seja interpretada como um ato de coragem, é preciso considerar que nossa sociedade é, sim, racista. E há 60 anos atrás, quando surgiu a primeira Barbie, era ainda mais.
De tal forma que ter mulheres negras no quadro de funcionários e acatar suas opiniões já poderia ser visto, naquela época, como algo revolucionário. Sem dúvida, não fossem essas mulheres, muitas meninas ainda não se sentiriam representadas em uma das bonecas mais populares em todo o mundo.
Se ninguém se parece comigo, eu não existo?
Não só de falas de ex-funcionárias é composto o documentário, mas também de meninas negras – hoje, mulheres – que cresceram nesse mundo sem referências.
A cada depoimento, é possível conhecer vivências diferentes relacionadas à boneca. Mas de um jeito ou de outro, todas elas falam sobre o quanto não se sentir representada afeta a autoestima.
A grosso modo, é difícil enxergar a ligação de uma coisa com a outra. Por isso, tenho falado de forma consistente sobre a importância da representatividade na construção da nossa autoestima. Aliás, esse é praticamente um dos principais panos de fundo do meu livro, o ♡ Além do Like ♡.
Apesar deste tópico estar em mais evidência nos últimos anos, ainda acho que nem sempre é explorado pela mídia com a profundidade merecida.
Tá cheio de gente falando sobre autoestima nas redes sociais. Na maioria das vezes, o que vejo (infelizmente) é um discurso vazio: atrelado à superficialidade da aparência física. Ok, passar um batom e reagir pode até ter lá sua relevância, mas, no fim do dia, precisamos ir na raiz do problema para construir um amor próprio mais profundo.
Não ter uma boneca que te representa, que não se parece com você, é o mesmo que dizer que você não existe. Que você não importa, que não é bonita.
Veja: a Barbie foi lançada em 1959, mas sua versão negra só nasceu 21 anos depois, em 1980.
Mesmo assim, o marketing feito em torno dela nunca chegou e ainda não chega aos pés do investido na Barbie tradicional. Isso faz com que a Barbie branca ainda seja vista como a Barbie “oficial”, a “de verdade”.
E essa falta de representatividade traz consequências reais, que vemos em todas as esferas da nossa sociedade.
The Clark Doll Experiment
Para exemplificar de forma bem clara o quanto a falta de representatividade impacta a autoestima de meninas e meninos ao redor do mundo, o documentário também lança mão do famoso estudo “Clark Doll Experiment”, feito em 1940 nos Estados Unidos; porém replicado várias vezes ao redor do mundo.
O casal de pesquisadores Kenneth e Mamie Clark queria saber qual a imagem que as crianças negras faziam delas mesmas. Eles usaram bonecas idênticas, sendo que a única diferença era a cor de pele – uma branca, e uma negra.
Então, faziam perguntas do tipo: “qual é a boneca má e qual é a boa?”; “Qual é a mais bonita”?; “Com qual você gostaria de brincar?”.
Eles descobriram que, de um modo geral, as crianças atribuíam características negativas à boneca negra, e preferiam sempre brincar com a branca. A última pergunta, no entanto, era a mais impactante. Eles perguntavam às crianças negras: “Qual boneca se parece mais com você?”. E as crianças, sem jeito, apontavam para a negra, um pouco decepcionadas por perceber que se pareciam com aquela que mais rejeitavam.
Apesar deste experimento ter sido feito há mais de 80 anos, ainda é uma ferramenta poderosa para mostrar o quanto os estereótipos raciais impactam a autoimagem das crianças e dão origem a uma série de preconceitos que estamos há séculos tentando desconstruir.
Contribuição individual
Quando escrevi meu livro, eu tive a preocupação de incluir ações que todo mundo pode adotar para contribuir para uma sociedade mais diversa e inclusiva. Quando o assunto é representatividade, também podemos passar a perseguir e exigir mais diversidade.
No caso da Barbie, a passos lentos as funcionárias conseguiram mostrar a importância da existência de uma boneca negra, e ainda estão lutando para que ela tenha o mesmo tipo de protagonismo do que a branca.
No nosso caso, individualmente podemos praticar e inspirar um olhar mais diverso. Quantas influenciadoras negras você segue? Você lê mulheres negras? Compra de mulheres negras? Está (literalmente) nas nossas mãos escolher para onde vai nosso dinheiro e para onde vai o nosso like. Essa é apenas uma forma simples, mas eficaz, de trazer mais relevância para as minorias.
Quanto mais estudo sobre comportamento, pressão estética e padrões de beleza, mais acredito no poder da representatividade como ferramenta para a construção de uma sociedade mais justa.
A representatividade traz autoestima e confiança, duas palavrinhas mais do que necessárias para que uma pessoa se sinta capaz de ocupar o lugar que ela quiser na sociedade.
Sobre o meu livro
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