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Canal do Youtube derruba mitos sobre dietas e a desinformação na área da ciência

Em tempos de harmonização facial, botox, bichectomia e muito preenchimento labial, é um verdadeiro deleite encontrar mulheres que usam seu espaço na rede para exaltar o intelecto, a reflexão, a investigação, o compartilhamento do saber…a ciência. ❤

Melhor ainda quando essas mulheres batalham para fazer as pessoas “desverem” as baboseiras que são divulgadas sobre soluções milagrosas para a saúde, o emagrecimento, ou outros mitos sobre ciência em geral que ganham força nos grupinhos do WhatsApp e acabam virando verdade absoluta para muita gente.

O canal Nunca vi 1 Cientista vem fazendo um bom trabalho nesse sentido, explicando com linguagem simples, memes e muito bom humor, que a ciência não é um bicho de sete cabeças. 

Foto: Reprodução Facebook Nunca vi 1 cientista

Eu conversei com as fundadoras do canal. A Ana Bonassa é bióloga, mestra e doutora em ciências, e atualmente faz pós-doutorado em metabolismo energético. A Laura de Freitas é farmacêutica-bioquímica, mestra e doutora em biociências e biotecnologia pela Unesp. 

A ideia começou em 2018, no FameLab Brasil, uma competição internacional de comunicação científica. Foi lá que as pessoas que hoje formam a equipe se conheceram e tiveram o insight. “Saí de lá com a convicção de que precisava criar algo, nos moldes do que temos hoje, e passei a reunir as pessoas para fazer parte. A Ana foi a primeira a se juntar à equipe e foi quem deu a ideia para o nome”, conta Laura. Leia a entrevista: 

Vocês devem receber muitas perguntas bizarras sobre dietas e sobre fórmulas mágicas de emagrecimento. Quais foram as mais curiosas até agora? 
Ana: Já recebemos sugestão para falar sobre dieta do ovo (o intestino deve ficar uma beleza, né?), dieta da água com limão, dieta do maple syrup (aquele melado que vende no Canadá e no mercado caro com coisas diferentonas) e também dieta dos signos. 

O que acontece é que nossos vídeos sempre têm embasamento científico, e tem muita dieta da moda que nem estudada foi, pra começo de conversa. 

Então, não tem como fazer vídeos sobre coisas que não podemos consultar a literatura científica para ver se funciona, se faz mal. Mas estamos de olho nas publicações, sempre que sai um estudo novo, a gente consulta nossos colegas cientista e especialistas. 

Foi assim por exemplo no vídeo da dieta low carb, que foi baseado em um artigo que saiu e causou muito rebuliço (entre praticantes, é claro). 

As pessoas geralmente não gostam quando falamos que a dieta amorzinho delas não faz tão bem assim quanto elas imaginavam. 

De que forma as dietas da moda prejudicam o nosso metabolismo?
Ana: Eu costumo falar que dieta boa é aquela que causa o efeito que a gente quer (perder, manter, aumentar peso) e a gente consegue manter pela vida, ou seja, precisa ser sustentável. 

Tem aquela dieta super restritiva que você acaba emagrecendo sim, mas assim que perde aqueles quilinhos e se dá “aquela permitida”, acaba recuperando tudo. É o tão temido efeito sanfona. 

Estudos mostram que isso não é legal para o nosso corpo. Mas as pessoas têm pressa e acabam tentando vários tipos de abordagens dietéticas, o que pode prejudicar nosso metabolismo, nosso intestino, nosso sistema imunológico, enfim, nossa saúde. 

Nessa área não parece ter muito segredo: a dieta mais estudada no mundo é a que se tem mais evidências de efeitos benéficos para o corpo, que é a restrição calórica e reeducação alimentar. Nisso, um nutricionista é essencial.

De acordo com a experiência de vocês, quais são as principais fontes de fake news no que diz respeito à ciência? 
Laura: WhatsApp e Facebook são as maiores fontes, até porque é onde estão as pessoas mais velhas, que têm mais dificuldade de identificar uma notícia como falsa. 

Mas já encontramos muitos sites de fazer sangrar os olhos de tanta informação errada fingindo ser científica. Eles tentam atrair as pessoas usando palavras complicadas e oferecendo curas milagrosas; uma pessoa que não é familiarizada com a ciência cai facilmente na conversa.

Vocês acreditam que tem como “reeducar” as pessoas para lerem com mais critério essas notícias sobre emagrecimento e dieta? 
Laura: Com o nosso trabalho, as pessoas que nos seguem passaram a duvidar das coisas de um jeito muito bom, e agora usam o nosso inbox para enviar produtos, serviços ou promessas que parecem bons demais para ser verdade. 

A dica é mostrar a construção do pensamento, como fazemos com nossos posts: sempre seguimos uma linha para as pessoas acompanharem o processo que nos fez chegar àquela conclusão. Com isso elas passam a criar o processo por si. 

Foto: Reprodução Facebook Nunca vi 1 cientista

Como está sendo o retorno das pessoas com relação a essa desmistificação da ciência? Que tipo de feedback vocês recebem?
Laura: Tem sido realmente incrível. Acho que sempre esperamos um bom feedback, mas nada como estamos recebendo.

Ontem mesmo recebemos um comentário no YouTube onde o cara dizia que nunca tinha se interessado por ciência na escola, mas com os nossos vídeos e explicações ele passou a não só se interessar, mas a gostar e ler mais sobre o assunto.

Sempre recebemos comentários do tipo “já tinha tentado entender isso antes, mas nunca consegui. Com a explicação de vocês eu entendi!”. Isso é exatamente o nosso objetivo e chega a marejar os olhos ver que estamos causando esse impacto positivo.

Falando um pouco sobre representatividade: vocês sentem que estão inspirando mais mulheres a encararem o campo da ciência? Se sim, por que acham isso importante?
Laura: Acreditamos que sim. Já recebemos alguns relatos de meninas em idade escolar que disseram ter decidido ser cientistas por nossa causa! Isso dá um incentivo sem tamanho. 

E é extremamente importante: mesmo em 2019 as mulheres continuam uma minoria na ciência no mundo, atingindo aproximadamente 30%. 

No Brasil os números são melhores, praticamente meio a meio, mas isso até o doutorado. Daí pra cima, nos cargos importantes, 60-70% são homens. 

A Academia Brasileira de Ciências tem apenas 14% de mulheres entre os membros. Ainda temos um longo caminho a percorrer para atingir a equidade, e inspirar meninas a seguir essa carreira é um dos passos.

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Foto principal: Girl with red hat | Unsplash